terça-feira, 28 de setembro de 2010

antes do degrau

às vezes
enquanto durmo
ou quando acordo cansado
sou justamente eu quem se manifesta
na fadiga de ver o sol nascer, eu não ouço aquilo
à toa. E talvez nem saiba quando atravesso as etapas
erradas. da vida. Vou despencando lance a lance da dura escada
até encerrá-la irrevogavelmente em minha queda, ou então encerrar-me eu
naquilo que não trago comigo, que abandono antes do vôo para não ferir nem quebrar

por exemplo Allan

Allan,
pequeno,
que dá vontade encerrar nos braços
e balançar
freneticamente

Aqui,
por exemplo Allan
para celebrar nosso fracasso
e desta vez me abraçar
suavemente

E Allan então
quando me arregaçar as veias sem sangrar
derramando sua aura lânguida,
fresta a fresta,
há de se perpetuar neste desesperado buraco negro que tenho no peito

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Entupiu-se de barbitúricos frente ao espelho
num suicídio impessoal
ensaiou os passos da partida
e num discurso emocionado
disse adeus à sua tristeza
imortal

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Então agora aqui eu me sinto novamente impelido a ir embora, a abandonar este lugar definitivamente, até que outra repentina intenção de volta me acometa e me meta em mais problemas, como se já não bastassem estes... Isso de querer morrer todo dia e de tentar fazer isso neste outro plano de existência em que, honestamente, temo existir mais do que fora. Sabe, não é fácil vir aqui e publicar estes poemas que, eu confesso, às vezes escrevo porque preciso, às vezes porque o próprio ambiente virtual/cafécomsuita me impulsiona, às vezes escrevo por nada, às vezes pra saber se sou tão alucinado aqui quanto devo parecer ser quando ando na rua. Estou cansado de ganhar esmolas de mim mesmo, de escrever esta poesia de migalhas, ser um poeta em pedaços justifica toda a minha a vida, como se ela fosse inteira, mas ela não é, porque agora eu mal comecei e já quero terminar, e eu não estou cansado, e eu não estou exatamente triste e nem sozinho, eu só sinto um tédio enorme da vida e isso me mata.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

que de perto
sinto imensa solidão
e me resumo a isso
e me repito
quando procuro
muro a muro
uma fenda sequer

A síntese da desmedida falta

Passo o dia inventando tristezas
porque até isso tem me faltado

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Casa de Família #2

Eu continuo triste
e encerrado dentro dos limites disso
como um bicho preso
que investe contra a grade que lhe resume
quando da sua própria força faz forca
ferido
trata de tolher a cura
nesta casa não se abre as portas
nem para sair
nem para entrar
encontro-me inevitavelmente embargado
trocando os pés
atirando-me contra as paredes
ruindo frente as paredes
desta nobre masmorra que chamo de lar

domingo, 12 de setembro de 2010

Nós escrevemos poemas e eles lêem gramática

???
????
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??????
¨ ( ) ^~
à
!
; ; ;
blábláblá
: .
ç #@%$&

^
´´´´´´´´
! = = + ] ] }°
pôésià naõ ê màtèmátîcã.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

post-scriptum para a pequena tragédia

Sou a personificação da falha,
da falência
sou só a tentativa frustrada de salvar o mundo
em mim

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Memê, seus sonhos não são assim tão pornográficos

Memê,

seus sonhos não são assim tão pornográficos
eu trouxe até a minha mãe pra ver
nem sequer bebemos cicuta, porra e ácido
meu bem, meu bem, Memê
são demasiado plácidos seus tais sonhos pornográficos
são quase que castrados seus tais sonhos pornográficos
e eu diria que ardia a falta
que poesia falta
apologia falsa
pornografia pra crianças de pau grande
e boceta arreganhada para cabeça fechada
tal qual mulata globeleza pelada, pintada
ou banheira do gugu
pra agitar televisão
as bailarinas semi-nuas do faustão
bailando rock, rock and roll
tocado como a ordem manda
nem beberam mijo
nem comeram merda
nem gozaram fogo
neném, seu sonho é pouco
não entramos nem no inferno
e me arrebatou o tédio
o meu membro sentiu tédio
o meu bucho sentiu tédio
o meu braço sentiu tédio
o meu pescoço sentiu tédio
os meus pés sentiram tédio
o meu cu morreu de tédio
dia destes o meu tédio
há de engolir você

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Tratado de Amor em Anne

Agora que estamos sós
e que o tempo é uma alegoria ao redor
gosto de te olhar os olhos
mesmo que você chore
ou que eles estejam fechados
Eu gosto do que te compõe
e da distância que nos redime
e do amor que nos consola

Quero te abraçar agora - e abraço
porque é só no teu braço que encontro tempestade e calma
como o amor que repousa na palma de nossa mão
sem que, no entanto, nos pertença
nada nos pertence e por isso temos tanto
O amor é necessariamente livre
e nós dançamos nus na chuva
como se não nos sobrasse ou faltasse nada

Gosto da tua conversa
e nunca tenho pressa quando estou contigo
Você não é tudo pra mim e por isso não me sufoca
assim, ao passo que sei que sei viver sem você
não quero fazê-lo - e não faço

The Charque Side of The Moon

Qualquer coisa

Uma bomba açu
ameaça cair
por sobre as cabeças
dos transeuntes
Eu ouço o berro, o choro, o gemido
o correr do automóvel
e um menino ferido a cantar
qualquer coisa
qualquer coisa
para desanuviar