quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Bilhete Íntimo (23/6/2010)

Não somos o que fomos, somos outros. Um para o outro outro. Somos sinceros ao passo que somos o que podemos ser. O fato é que o que podemos ser faz de nós dois bichos opostos. Sim, não somos iguais e isso é bonito e alivia. Alivia porque não há Narciso e Narciso é nosso erro, sempre foi, mesmo antes de haver erro. Sinto pena do que há de mim nos outros e de mim você não tem nada (exceto a mim), por isso posso te olhar sem o peso da compaixão e podemos trocar socos e abraços sem que atinjamos a nós, apenas a um ou a outro - ou a um e outro. Há uma coisa que paira acima de nossas cabeças e que nos une, como um sexo imaterial, anulando tudo o que podemos querer pretender ser nos colocando frente a frente como se fóssemos um espelho em que não se reflete o que se é mas o que se quer. Por isso, por esse querer egoísta e altruísta ao mesmo tempo, consonante e dissonante, eterno e finito, imenso e ínfimo, mudo e ululante, apaixonado e não, é que não podemos simplesmente ir embora. Só acenda as lâmpadas de manhã, não há nada o que iluminar no escuro.

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