sexta-feira, 27 de agosto de 2010

O Caminhante

O caminhante arranha a superfície da terra
e canta
canção que eu desconheço
mas que me alcança
porque eu me reconheço em tudo quanto eu desconheço
porque eu me reconheço no que eu não posso saber

O caminhante mastiga o pão do lixo
e náusea
a náusea que não me afeta
mas me machuca
porque o que não me afeta me machuca
porque o que não me afeta me despedaça

O caminhante rasga a carne nos escombros
e chora
um choro que a mim não molha
mas encharca
porque me encharca tudo aquilo que me seca
porque desaguo para aquele que peca

O caminhante corta os pulsos da estrada
e sangra
um sangue que a mim não suja
mas me anemiza
porque me anemiza aquilo que não se alimenta
porque me anemiza o que nunca se ameniza

O caminhante deflagra o feio da vida
e morre
uma morte que não me culpa
mas me atormenta
porque me atormentam os que não me culpam
pois se não me culpam sou tão podre quanto és/sois

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